Menina dos olhos verdes,
Invocaste um feitiço que me deixou quieto,
paralisado com o pensamento do teu jeito
sonhador que me faz também sonhar. O primeiro
olhar foi assumidamente distraído e inocente, mas
cheio de significado. Quis dizer, quis ser o começo
de um sentimento que não pára de crescer.
O tempo foi passando e os meus olhos começaram
a ficar da cor dos teus. O meu eu saiu de mim sem
me aperceber e deixei de me conhecer. Fiquei
sem conseguir compreender se a distracção tinha sido minha,
se a magia que senti não seria magia.
Mais uma vez o mar trouxe-me o teu aroma,
que só veio confirmar que o feitiço deveras aconteceu.
Menina dos olhos verdes, do olhar sonhador,
O tempo tornou-se meu inimigo;
tenho travado uma luta injusta que não parece ter fim,
que não consigo vencer. Sou vencido duas vezes:
uma pelos teus olhos e outra pelo tempo. Mas sou também
vencedor porque ganhei o teu querer, ainda que sem querer.
Depressa o teu olhar passou de distraído a cheio de intenção,
mesmo que o não soubesses. Foi isso que senti e me deixou
preso à linha ténue que separava o apaixonar-me por ti.
Aproximei-me.
Devagar, como quem domina a impaciência
de não conseguir raciocinar.
Menina dos olhos verdes, princesa dos poetas,
Encontro-me muitas vezes à briga com as palavras,
no desespero de encontrar expressões que definam
a tua singular beleza. Todos os adjectivos terão de ser
reinventados, porque têm de ser únicos, plurais, superlativos,
tudo isto ao mesmo tempo. Passaste, sem esforço, de uma visão
agradável a uma certeza de beleza; aquela certeza que os nossos
olhos têm quando foram feridos pelas flechas do Amor.
Penso ser óbvio neste momento que levei com uma chuva delas,
sendo cada uma a representação individual dos teus cabelos
à deriva por entre os meus dedos.
Menina dos olhos verdes, dos cabelos dourados,
A minha história foi escrita numa jangada que vagueou ao sabor
do vento na tua direcção. Deixou de ser a minha história e passou
a ser a nossa, naquela noite perfeita em que enlouquecemos,
rebentámos com a vontade acumulada pela impossibilidade que
foi imposta no nosso caminho. Até essa noite nunca teria imaginado
que um simples toque de mãos pudesse ser mais intenso que
o beijo mais apaixonado. Lembras-te quando as nossas mãos se tocaram?
Estava escrito assim nas estrelas, que todas as noites guiaram o nosso
andar, o nosso percorrer da realidade na procura do sonho.
Menina dos olhos verdes, da cor do mar,
Não há um dia que passe em que eu não me recorde:
o teu deslizar, o teu pairar de princesa enquanto corrias,
que nem uma criança na direcção do mar. Tudo isto banhada
pela luz do mais bonito luar. A melodia de te ver correr fez-me
sonhar acordado, ao realizar que o chapinhar dos teus pés na água
me fazia sorrir. E assim fiquei, a sorrir; a olhar-te sem dizer nada
para não deitar a perder nada.
Comecei a absorver-te sem conseguir parar, e quando dei por mim
já não estavas por perto, o dia começara a nascer.
Mas voltemos àquela noite, menina dos olhos verdes,
A noite em que as incertezas se tornaram notícia, pois explodi
a gritar para as estrelas, a contar a boa nova: a minha história
estava completa, porque estava contigo! Rapidamente o céu
começou a mudar; já tinha pedido à Lua que organizasse
um concerto estelar para embalar as horas em que escrevemos
o nosso poema. Nem reparámos que o espaço era tão apertado,
exíguo mesmo. A força que nos impelia na direcção um do outro
era tal que abraçar-nos era o nosso luxo, era o nosso espaço.
Ah… e depois surgiu o beijo, o tão esperado beijo.
Os nossos lábios tiveram dificuldade em perceber o que aconteceu
quando se tocaram, tal não foi a intensidade.
Sem saberem como reagir, foram-se encaixando, saciando loucamente
o desejo insaciável. Parecia o primeiro beijo. A atracção foi
tão avassaladora que o movimento se tornou torpe,
inconsequente, descontrolado.
Como poderíamos controlar tamanho desejo?
Menina dos olhos verdes; Ah! menina,
Os dias custam a passar quando apenas existe memória.
Lembrar o inevitável encontro que se perdeu no tempo é
doloroso e incontornável. Queria sorrir e pensar que os teus olhos
poderiam ser meus, mas como ambos sabemos, por vezes…
o querer não chega.
Falta coragem!
Falta não querer deixar morrer o sentimento nobre dos amantes
que não controlam o seu próprio sentir. Falta-nos sentir-nos outra vez,
outra e outra vez. Apostar em nós sem receio do que possa acontecer.
Porque o destino assim o diz, porque o destino assim o quis.
Menina dos olhos verdes, verdes, verdes!
Queria saber esperar. Ter paciência, controlar o desejo.
Mas sei que se foi o destino que te colocou no meu caminho,
também pode ser ele a subtrair-te do meu coração.
O núcleo de um poeta é o seu coração, que tem de ser regado,
irrigado, alimentado com o suco da paixão. Talvez consiga
aguentar mais um pouco, não sei… fá-lo-ei em nome da intensidade
que sentimos, os dois. Ainda que tenha sido breve, vou para sempre
reter a expressão na tua face quando, sem defesas,
te encontraste deitada no meu regaço.
Vou cantar a nossa canção, tentar aperfeiçoá-la, adjectivá-la como merece.
Mesmo que já esteja a ficar rouco, acredito que os teus olhos
não me enfeitiçaram em vão. Acredito que os nossos lábios se vão
encontrar outra vez. Seria duro demais não acreditar.
Menina dos olhos verdes, perdidos no tempo,
Vem, vamos envelhecer juntos como o vinho
que tanto gostamos. Vamo-nos embriagar um no outro,
quais grainhas que namoram no ventre da uva até que
o tempo diga que é tempo.
Vamos transformar-nos um no outro.
Vem, não tenhas medo; estou aqui à tua espera e prometo
guardar segredo.
Um suspiro, um sussurrar teu e o nosso sonho pode ser verdade.
Vem, não tenhas medo, vamos fugir de viver na saudade.